Estática no maior patamar dos últimos seis anos, a taxa básica de juros começa a trazer os primeiros efeitos negativos para a economia nacional, com freio na atividade dos três principais setores responsáveis pelo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) — soma de todos os bens e serviços finais produzidos no país.
Entre março de 2021 e agosto do ano passado, a taxa Selic saltou 11,25 pontos percentuais, de 2% para 13,75% ao ano. A disparada foi motivada pela tentativa de conter o avanço da inflação, que começava a se descolar do teto da meta preestabelecida pelo governo.
Nesta quarta-feira (1º), na primeira decisão no governo Lula, o Copom manteve a taxa em 13,75%, pela quinta vez seguida, desde agosto de 2022, no patamar mais alto a partir de 2017. A Selic ficará vigente até o fim do mês de março.
Ao justificar, o BC afirmou que a decisão “reflete a incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos com variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva, e é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui os anos de 2023 e, em grau maior, de 2024”.
O BC avaliou ainda que, “sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego”.
Os vereditos pela elevação dos juros para conter a inflação já se refletem nos últimos dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Enquanto o ramo de serviços, grande motor econômico do Brasil, fechou novembro sem crescimento pelo segundo mês seguido, o comércio (-0,6%) e a indústria (-0,1%) amargaram resultados negativos no mesmo período.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) avalia que a Selic se encontra em patamar alto o suficiente para inibir a atividade econômica e contribuir para a desaceleração da inflação há mais de um ano.
“A taxa básica de juros no patamar atual foi um dos fatores determinantes para a desaceleração da atividade econômica no segundo semestre de 2022 e continuará sendo um limitador significativo para o crescimento da atividade em 2023, quando as previsões para o PIB indicam alta de apenas 0,8%, segundo o Boletim Focus do BC”, explica o gerente de política econômica da CNI, Fábio Guerra.
Para Rachel de Sá, chefe de economia da Rico, o freio da atividade econômica reflete a defasagem da decisão a respeito da taxa de juros nos grandes setores econômicos. “Quando um banco central sobe ou desce os juros, isso demora um tempo para impactar a economia”, explica ela.
“Hoje, nós já vemos o varejo e o próprio setor de serviços prestados à família, que vinha muito forte ao longo do ano passado, em desaceleração. Dentro do varejo, algumas categorias até subiram, mas elas são menos ligadas ao crédito e menos essenciais, como o de automóveis e eletrodomésticos, que claramente perdem fôlego. […] Todo esse enfraquecimento também afeta a indústria”, analisa Rachel.
De acordo com André Macedo, gerente do IBGE encarregado da Pesquisa Industrial Mensal (PIM), o desempenho tímido do setor que responde por cerca de 20% do PIB nacional, que opera em um nível 2,2% abaixo do patamar pré-pandemia, é reflexo da perda de intensidade da economia brasileira.
“Não se pode tirar de vista que a economia mostra sinais de perda de intensidade, com taxas de inadimplência em patamares altos, taxa de juros em elevação, e especialmente os bens de consumo duráveis, embora tenham uma associação com a renda, possuem também uma relação direta com a evolução do crédito”, afirma Macedo.
As percepções levam em conta o potencial da taxa básica de juros como principal ferramenta de política monetária para conter o avanço da inflação. Isso acontece porque os juros mais altos encarecem o crédito, reduzem a disposição para consumir e estimulam novas opções de investimento pelas famílias.
Reflexos na Bolsa
O salto da taxa básica de juros ao maior nível desde o início de 2017 também refletiu negativamente na Bolsa de Valores no ano passado, com a queda superior a 50% de todas as ações de empresas varejistas.
Entre as perdas, aparecem entre os destaques as gigantes Americanas (AMER3), Magazine Luiza (MGLU3) e Via Varejo (VIIA3), que desabaram, respectivamente, 68,7%, 62% e 54,3% entre janeiro e dezembro de 2022.
Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil, afirma que o comércio depende muito do crescimento econômico local e da geração de emprego e renda para que as pessoas possam consumir mais.
“Se o consumidor está com o poder de compra ‘amassado’, sem confiança em relação ao futuro e ao emprego, ele tende a ser mais precavido e a evitar gastos desnecessários, e até mesmo fundamentais, como o gasto com cuidados de saúde preventiva”, destaca ele.
“A piora do cenário econômico nos últimos meses por conta da inflação ainda elevada e dos juros altos, que devem voltar a subir, fez os investidores evitarem ações de varejo”, completa Alves.
Fonte: D24am