Manaus, capital do Estado do Amazonas, está localizada próxima a linha do Equador, na confluência dos rios Negro e Solimões. Pelo Tratado de Tordesilhas – firmado entre os reinos de Portugal e Espanha, a região Amazônica pertencia primariamente aos espanhóis. Somente em 1750 com o Tratado de Madri a região passou definitivamente ao controle de Portugal.
Tendo como principal fonte econômica no Século XIX a extração do latex, a região prosperou abundantemente com a exportação da borracha, luxo e riqueza fizeram de Manaus a Paris das selvas. Nossa cidade foi a primeira no Brasil a receber luz elétrica, galerias pluviais, tratamento de água e esgoto, serviço de transporte com bonde elétrico, inaugurando sua primeira universidade em 1909 e com ela a primeira faculdade de Direito do Brasil, localizada no hoje Grupo Escolar Saldanha Marinho.
Na mesma época e fruto do desenvolvimento econômico até então sem paralelo a cidade foi marcada por grandes obras como o Teatro Amazonas, o Palácio Rio Negro, a Alfândega e o Mercado Adolpho Lisboa.
Em 1910 com o mercado exportador da borracha migrando para a Ásia, em vista da bem sucedida biopirataria ocorrida com as sementes de borracha implantadas na Malásia pelos Ingleses, Manaus e a região amazônica entraram em um período amargo de abandono e decadência.
O renascimento da cidade ocorreu a partir do Século XX, com a criação da Zona Franca de Manaus. Projeto inagurado na década de 60 cujo objetivo, dentre outros, visava a proteção da amazônia e salvaguardar a soberania da região,acabou se tornando o principal esteio econômico e de desenvolvimento.
Durante as décadas de 70 e principalmente de 80 voltado para a importação de produtos acabados, Manaus conheceu um novo ciclo de abundância com o famoso “turismo de compras”, pessoas de outros Estados vinham a cidade para adquirir as novidades do estrangeiro, produzidas ou importadas pelo modelo ZFM, dentre os itens de destaque os aparelhos de TV, videocassetes, gravadores, motores de popa, motos e brinquedos, de Paris das selvas, Manaus se transformou na Miami dos trópicos.
Época de esplendor, do boom de comércio nas importadoras do centro da cidade, das saudosas lojas Open, Baby Blue, Carrossel, Belmiros, Benetton, Oriente, além das mais populares como Lobraz, Sortidão e Sukatão, em que os visitantes vinham a Manaus para “comprar na zona franca”, almoçar os deliciosos pratos regionais servidos no restaurante do Hotel Amazonas, aos mais abastados e em geral “gringos” oportunidade de se hospedar no luxuoso Hotel Tropical, localizado na Praia da Ponta Negra, tendo como atrações além da culinária, a piscina de ondas, a única na cidade, os passeios de barco saindo do cais próprio do hotel, a visita ao seu zoológico, pequeno em comparação com o do Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS) mantido pelo Exército Brasileiro mas igualmente atraente, na saída, percorrer as lojas localizadas no átrio, comprar artesanatos e também importatos, pois não.
Sem esquecer do restaurante La Barca, localizado no bairro do Parque 10 de novembro,que atraía as famílias para o almoço nos finais de semana, crianças brincando no playcenter Tom & Jerry, localizado na “bola da Suframa”, ali nas imediações assistiam as peças do Tio Barbosa ou as apresentações do boneco Peteleco e seu criador, o ventríloco mais conhecido de nossa região, o saudoso Oscarino, no Teatro do Cecomiz, primeiro shopping center de Manaus, centro de exposição e venda dos produtos do pólo industrial.
Aos mais sofisticados, havia também a opção de jantar no restaurante do Aeroporto Internacional Brigadeiro Eduardo Gomes, enquanto aguardava-se o serviço, a prática natural era a de observar no “deck” o pouso e a decolagem dos aviões, prática muito aguardada pelo público mirim que entre um avião e outro deslizava nas rampas ali localizadas como se fossem escorregadores em um playground, para desespero dos pais e no dia seguinte trabalho maior para as mães ao cuidar das roupas dos pequenos.
Tomar o sorvete de duas bolas, o Ziz Cascalhão do Ziza’s da Praça 14 ou comer os sanduíches e tortas da Alemã, o X-Salada do Energia, os Sorvetes da Glacial, o tacacá da Gisela, o X-Porco do Bar do Armando, a cerveja mais do que gelada do Caldeira, o bacalhau extraordinário do Calçada Alta, o churrasco da Búfalo, a original do centro da cidade, experiências gastronômicas que todo bom manauara certamente teve em sua vida.
Os jogos no antigo Vivaldão, o campeonato de arrancada nas ruas da cidade, os jogos estudantis, os festivais de música, os esportes nas praças, as corridas de rua, os torneios de jiu-jitsu e sua rivalidade com os praticantes da luta-livre, as travessias e campeonatos de natação, Clube da Caixa e Kako Nadadores sempre disputando os primeiros lugares.
Nas artes, o Clube da Madrugada, as poesias de Thiago de Mello, as músicas do grupo Raízes Caboclas com as letras de Celdo Braga a retratar para o Brasil e o mundo as nossas tradições, o tik, tik, tak do grupo Carrapicho que encantou a França, o Porto de Lenha de Torrinho e Aldízio Figueiras, o saxofone de Teixeira de Manaus, a voz de Abílio Farias, a irreverência de Nunes Filho que está sempre “subindo pelas paredes”.
Tempo e espaço aqui não permitem que traga à memória todas as lembranças de uma Manaus que parece ter ficado para trás, hoje infelizmente nosso comércio sobrevive com muita dificuldade, nossas importadoras fecharam as portas, vez por outra o próprio modelo Zona Franca, por mais temporário que seja, se vê ameaçado,defensores de ocasião há muitos, mas a falta de compromisso com nosso povo, nossa gente, nossa história se faz cada vez mais latente.
Produzido nos anos 90 pela agência Oana Comunicação, o jingle “Manaus meu Ciúme”, com cenas de nossa belíssima cidade, dizia: “o coração falou mais alto e foi um toque de emoção, que mexeu com sua vida que mudou sua afeição, mudou seu corpo, seu astral, o seu perfume, Manaus agora é o meu ciúme.
Nestes 353 anos de existência minha Manaus, a nossa Manaus, a Manaus de todos continua sendo o nosso ciúme, porém ciúme pressupõe cuidado oirundo de um receio, medo de se perder alguém ou algo, em sendo assim neste aniversário, nosso ciúme está precisando de cuidados, do contrário em um futuro não muito distante teremos que nos contentar somente com as lembranças das belezas que um dia tivemos.
Anderson F. Fonseca. Professor de Direito Constitucional. Advogado. Especialista em Comércio Exterior e ZFM. IG: @anderson.f.fonseca