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Até Quando?

E m audiência online realizada perante a 2a Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, a advogada catarinense Malu Borge Nunes teve que passer pelo infortúnio de ser repreendida pelo Relator de seu processo uma vez que ao ouvir o choro do filho da causídica, infante de colo, afirmou que o ato da sessão “não pode ter cachorro latindo e criança chorando” porque supostamente “tira a concentricão no julgamento.

Desnecessário tecer maiores considerações sobre o ocorrido, memso porque todos os periódicos, jurídicos ou não, noticiaram amplamente o fato, afora as manifestações nas redes sociais, notas, menções e outros. Em alguns casos, em contraponto ao ocorrido no Superior Tribunal de Justiça, já acompanhamos situação em julgamento no qual os ministros tiveram a sensibilidade de dar prioridade ao advogado que compareceu ao julgamento com seu filho de 1 ano de idade.

Vindo de uma família juridica com pai e mãe advogados, desde muito cedo também fui apresentado ao sistema judicial de nosso país, por vezes e à época por ser assim que se fazia, acompanhei ora meu pai em audiências as mais variadas, ora minha mãe em aulas na saudoda jaqueira, de onde somos todos egressos, até as atividades de prática profissional. 

Certa feita, pelo pouco que lembro da história visto ser muito criança, meu pai foi atender um chamado de um constituinte a noite no horário de aula de minha mãe, pelo horário não foi possível chamar nenhum de meus avós para ficar comigo, sim naquela época contava-se com a família e não se tinha à disposição babás, cuidadoras, coachs infantis e outros, razão porque lá fui eu com meus 2 aninhos para a Faculdade de Direito no largo dos Remédios. 

Como é natural de toda criança, devo ter estranhado o ambiente, as pessoas, o entra e sai de alunos e como bom futuro advogado externei meu protesto em forma de choro em meio a aula (que depois soube) de Direito Constitucional (disciplina que viria a lecionar anos mais tarde na mesma Jaqueira), “tirando a concentração” do saudoso professor João Braga (que também anos mais tarde veio a lecionar a mim as letras do Direito Constitucional).

Estávamos na década de 80 e já naquela época o professor, bem como a turma, tiveram a sensibilidade suficiente para pedir permissão para que minha mãe não se ausentasse de sala e com paciência o mestre graduasse a voz um pouco mais baixo para que eu pudesse me acalmar e então prosseguir com a explicação, qual não foi a surpresa ao não somente ser atendido, como o próprio professor ter sido gentil ao atender ao pedido dos colegas de turma e de minha genitora como ao final, quando meu pai findo o compromisso buscou-nos na Faculdade encontrou com o mestre a lhe dizer que não imaginava que teria um aluno assim tão jovem em sala (brincadeira esta que também hoje reproduzo em sala de aula quando me deparo com estas situações)

Traçando um paralelo com o ocorrido recentemente no TJAM e minha pequena experiência familiar, chama a atenção alguns pontos que penso passaram desapercebidos, somente a título de análise e reflexão.

O primeiro deles diz respeito a imperiosidade legal de que advogadas-mães lactantes tem prioridade em julgamentos nos Tribunais, não é qualquer favor, é exigência da Lei 13.363/16 que além da prioridade garante o direito de atender eventual necessidade da criança, ora tal qual a história contata, o meio de externar este “pela Ordem” é, salvo engano ou grave omissão, pelo meio do choro, de se perguntar então se acaso o legislador não “pensou”nesta circunstância ao elaborar a lei ou o seu aplicador desconhece essa situação, natural de todas as coisas.
 Segundo ponto e quem sabe com um pouco mais de atenção que o primeiro se dá no fato de que se faziam presentes na Sessão, além do Relator, três outros julgadores, além da representante do Ministério Público, fechando o total de sete pessoas na sessão virtual com a secretária da 2a Câmara, nenhum destes ponderou com o nobre Relator, não digo se insurgir, mas ao menos ponderar com o julgador para sensibilizá-lo acerca do que estava acontecendo.

Em minha experiência aqui transcrita lembro que os próprios colegas vieram ao auxílio de minha mãe a solicitar uma compreensão do mestre para eventual “falta de concentração”com meu choro, pelo menos do que está disponível nas mídias que noticiaram o caso não ouve qualquer manifestação, incluso do julgador oriundo do quinto constitucional da classe da advocacia a quem sabe ponderar acerca das prerrogativas da colega naquele instante.

Ciente das dificuldades e da liturgia que o próprio sistema de Justiça impõe, faço a indagação do título, “até quando?” até quando situações como esta serão objeto de nossa prática?, até quando mulheres, mães, lactantes ou não, terão que ouvir ponderações desta natureza?, até quando nossas prerrogativas serão objeto de “incômodo” ou de “tolerância” nas Cortes?, até quando irá faltar a solidariedade com as situações alheias como se fossem nossas? até quando…?

Infelizmente neste momento histórico temos mais indagações do que respostas, porém nada a temer as instituições de representação da classe já soltaram as suas notas de repúdio e solidariedade resolvendo de vez como todos estes problemas. Cartas para redação.
 

Anderson F. Fonseca. Professor de Direito Constitucional.                    

Advogado. Especialista em Comércio Exterior e ZFM.

 

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