Capitão reformado fiel às raízes, Jair Bolsonaro todo ano batia ponto duas ou três vezes na sua alma mater, a Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende, no estado do Rio. Quando cumpria o roteiro completo, ia em fevereiro, para a recepção de novos cadetes, depois em agosto, na entrega de espadim — formalização da entrada na vida militar —, e, por fim, em dezembro, na entrega de espada, como é chamada a formatura.
No início de 2018, meses antes de ser eleito presidente, ele cumpriu o ritual — só que, naquela oportunidade, com repercussões político-familiares que persistem até hoje. Como sempre fazia nas idas à cidade, visitou seu João e dona Cida, pais de Rogéria Bolsonaro, sua primeira mulher e mãe de seus três filhos políticos. Detalhe: estava então com a atual mulher, Michelle Bolsonaro. Rogéria não gostou e ligou para dizer que os pais não a recebessem, mas era tarde — o casal já havia chegado. Michelle soube da ligação. Criou-se tamanho mal-estar que ela pediu ao marido que vetasse a pretensão da ex de se candidatar a deputada federal, o que de fato aconteceu.
Passados quatro anos, a birra continua forte e reverberando no cenário eleitoral: ventilado como suplente do senador Romário (PL-RJ), que busca ser ungido novamente ao cargo neste ano, o nome de Rogéria foi mais uma vez atropelado pela intervenção de Michelle, que, segundo pessoas próximas à família, interveio e esfriou o movimento concebido pelo primogênito do presidente (e de Rogéria), o também senador Flávio Bolsonaro.
Não se pode dizer que a rixa seja inesperada, já que a convivência entre ex e atual mulher nem sempre é pacífica — e no caso de Bolsonaro elas são três. Discreta em público, mas cada vez mais atuante no projeto de reeleição do marido — ela acaba de se filiar ao PL e aparecerá no programa de TV do partido —, Michelle e a segunda ex do presidente, Ana Cristina Valle, tampouco se bicam. Ao contrário de Rogéria, que nunca cortou relações com o ex-marido, a belicosa Ana Cristina, pivô de uma separação conturbada e enrolada no esquema de rachadinha no gabinete do vereador Carlos Bolsonaro, se dá mal não só com Michelle, mas com o próprio Bolsonaro, enquanto busca uma carreira política. Em 2018, tentou ser deputada federal pelo Podemos, em vez do PSL, então partido da família. Obteve pouco mais de 4 500 votos.
Neste ano, Ana Cristina fará nova incursão eleitoral, outra vez fora da nova legenda presidencial: concorrerá a deputada distrital pelo PP, em Brasília. “Foi um caminho natural, já que trabalha como assessora no meu gabinete há três anos. Ela tem vida própria”, desconversa a deputada federal Celina Leão, presidente regional do PP. Na verdade, Ana Cristina sabe que, na questão do apoio bolsonarista a suas ambições, o passado a condena. Ao se separarem, em 2007, ela registrou um boletim de ocorrência acusando Bolsonaro de ter furtado um cofre com dinheiro e joias que guardavam juntos (o caso foi arquivado). Naquele mesmo ano, incorreu na fúria de Michelle quando, de acordo com três pessoas do círculo do clã, procurou o ex para lançar maledicências e questionar a índole de sua nova parceira.
Fonte: Veja Abril