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Identidade Cultural x Identidade Nacional

Após a eliminação da Seleção Brasileira da Copa do Mundo do Catar no fatídico jogo contra a Croácia no empate de 1×1 e cobranças de pênaltis desperdiçados pelo Brasil, não faltaram críticas e análises sobre o ocorrido, passado o momento de absorver o resultado, com ânimos mais contidos vimos na mídia em geral indagações e perspectivas sobre o futuro da Seleção, quem será o novo treinador, se jogadores de hoje serão chamados, dentre outros.

No meio de tantas análises chamou atenção a este articulista algumas ponderações feitas pelo controverso e conhecido comentarista esportivo Walter Casagrande, em entrevista publicada nos principais periódicos nacionais encontramos a seguinte afirmação: “A seleção precisa jogar mais no Brasil, não só em jogos de eliminatórias, mas também em amistosos espalhados pelas capitais do país. Os torcedores de todo o Brasil têm o direito e merecem ver os seus ídolos de perto. É assim que se conquista identidade e aproximação com a realidade brasileira. O povo precisa se sentir pertencente a esse processo de recuperação da imagem da seleção brasileira por todo país. É uma questão de acolhimento: os torcedores acolhem a seleção,  os jogadores acolhem esses torcedores”

Quer parecer que Casagrande tocou em um ponto muito sensível de nossa corrente realidade, a falta de identificação dos torcedores com aqueles que foram escalados pelo professor Tite para esta busca pelo Hexa, em sua maioria jogadores com atuação no exterior, majoritariamente na Europa, dos 26 convocados somente 3 atuantes em clubes nacionais, Everton Ribeiro e Pedro pelo Flamengo e Veverton pelo Palmeiras.

Esta circunstância nos levou a indagar acerca da chamada identidade cultural brasileira e o sentido de nacionalismo que deve ou pelo menos deveria existir em nossa sociedade, de um lado tem-se uma clara manifestação de que estamos juntos e torcemos por nossas cores em momentos de congraçamento esportivo, mas o que verdadeiramente deveria nos unir enquanto Nação? Quais os elementos deste identidade e aproximação com a realidade brasileira, como dito por Casagrande?

Impõe que se faça uma distinção entre ambas, identidade cultural e nacional, nosso País no mundo afora é conhecido por ser um país de forte identidade cultural, contudo identidade cultural não significa necessariamente clara identidade nacional, nem mesmo autoestima, a exemplo do México que possui até hoje manifesta identidade cultural em suas cores, sons e temperos contudo perdeu decerto a ideia de independência e identidade nacional após adesão ao Tratado Norte-Americano de Livre Comércio.

Nossa identidade cultural se expressa na língua comum, na raça mestiça, nos imigrantes integrados, na maravilhosa arte dos índios, na nossa maravilhosa música popular e clássica, nas nossas comidas típicas, no carnaval, no boi bumbá, na nossa exuberância,beleza e alegria tropical. Tudo isso nos torna conscientes de quem somos e orgulhosos de nós mesmos.

Em países economicamente mais desenvolvidos, como o Canadá, Estados Unidos, Austrália, dentre outros, essa identidade cultural é mais difusa, por outro lado nesses países há uma clara consciência de nação, uma forte identidade política nacional, dado que os cidadãos não tem dúvida de qual é dever do seu governo. Por sua vez nós brasileiros estamos divididos, e até mesmo inferiorizados, perdemos o conceito de interesse nacional, há um nítido sentimento de “nós e eles”, de que o contraditório não merece ouvidos, não pode ser aceito, há uma dissociação entre o que se passa nos campos jurídico e político apartado da realidade social brasileira.

 A identidade cultural está entranhada na sociedade, enquanto a identidade nacional é política – está relacionada com a capacidade das elites (não necessariamente econômica) e de seu povo terem um conceito de Nação. Há, portanto, a possibilidade de um país ter forte identidade cultural mas fraca identidade política nacional. Esse é o caso do Brasil, este é o caso retratado no comentário de Casagrande sobre a Seleção, forte identidade cultural com as cores verde e amarela, pouca ou quase nenhuma identificação com os jogadores, forte identidade cultural com aquilo que somos, pouca identidade nacional com o “ser politico” brasileiro.

Entre a identidade cultural e a identidade política nacional está a autoestima. Nós brasileiros somos orgulhosos de nossas peculiaridades culturais, mas nossa autoestima é ainda baixa, vide o pensamento existente de ser a nossa identidade cultural em geral associada ao exotismo, nossas expressões culturais quando não populares são transplantadas, cópias sem crítica, o melhor está sempre fora, o outro, o estrangeiro deve ser assimilado, na linguagem, nas festas (Halloween o maior exemplo), na política, aceitamos quase que passivamente a depreciação de nossos setimento nacional, bom é ser brasileiro vivendo no exterior, os que ficam devem se resignar a aceitar o que aí está.

Luiz Carlos Bresser Pereira, em seu livro A Construção Política e Econômica do Brasil nos ensina que a identidade nacional está relacionada com o nacionalismo, mas com ele não se confunde. É também um fenômeno cultural, já que depende do êxito da nação em transformar em realidade os objetivos de desenvolvimento econômico e político.

A nação é assim a sociedade politicamente organizada com vistas à autonomia nacional e ao desenvolvimento econômico, havendo estrita correlação entre este e o sentimento de autoestima, se a Nação está realmente sendo construída, a autoestima do seu povo será alta, do contrário o sentimento de pertencimento será o mesmo encontrado entre os jogadores da atual Seleção com os torcedores brasileiros, culturalmente identificados, mas nacionalmente distantes.

Penso que nossa autoestima está baixa há muito tempo,  tivemos um projeto de Nação entre 1930 e 1980, reconhecemos os conflitos e ao todo havia uma solidariedade básica entre as classes que é a condição da existência de uma Nação.

No momento em que finalizo estes pensamentos se noticia que a diplomação do eleito a vaga de Presidente da República ocasionou diversos protestos, atos de violência e vandalismo na Capital federal, familias com crianças em shoppings temendo por sua segurança e vida, correndo para se abrigar, desrespeito ao mínimo que consideramos mais importante, a família. Já é hora de nos reconciliarmos, independente de lados, temos a oportunidade de fazer diferente, de resgatar verdadeiramente o que significa ser uma Nação.

 

Anderson F. Fonseca. Professor de Direito Constitucional.                                                                        Advogado. Especialista em Comércio Exterior e ZFM.

 

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